AS OVELHAS E SEUS MEMES

Numa época onde a relação sexual não consentida é digna de legítima preocupação, ninguém parece se importar com os endêmicos estupros mentais aos quais a maioria se submete e resultam em “partos” replicadores de idéias de quem sequer lhes pagou um jantar.

Como exemplo da passividade mental contemporânea dos rebanhos humanos, os Pró-Vida se unem sob lideranças religiosas sem sequer se dar conta de que a própria Igreja Católica há poucos séculos não tinha posição definida sobre o aborto, e que a Bíblia não só não o proíbe explicitamente como tem algumas passagens [Êxodo 21:22, Jó 3, Eclesiastes 3:6 ] que podem ser interpretadas a seu favor.

Os Pró-Escolha bradam em nome das mulheres mortas em abortos clandestinos ignorando que há menos de duas décadas as ONGs abortistas internacionais não davam a mínima para o problema, apesar do número de mortas ser muitíssimo maior, e que a “preocupação” com a Saúde Pública só entrou em pauta quando certos países europeus se mostraram imunes aos argumentos da Autonomia reprodutiva, do Planejamento Familiar e da Superpopulação, levando-as a apelar para a 3a categoria de mentiras Twainianas.

No meio desses replicadores cerebrais de aliens meméticos, àquele que insiste em pensar por si próprio (se não para achar seu lugar no mundo, ao menos para achar a si mesmo dentro da própria mente) sobra poucas opções, uma delas observar a luta dos adversários tal qual o videogamer que coloca CPU contra CPU num jogo de luta e só decide intervir quando perde a paciência em ver que um dos personagens não usa aquele movimento especial, ou o usa inutilmente.

Ainda assim irrita ver mesmo na mais alta corte do país debates estéreis sobre a origem da vida que parecem ignorar que as únicas tradições que podem dizer alguma coisa sobre o assunto, a Filosofia e a Biologia, há muito deixaram claro que é impossível definir ‘Vida’. Isso quando não colocam Espiritualidade no meio, o que só torna o problema duplamente insolúvel, e ainda assim ninguém se atreve a ter uma idéia original sobre o tema.

Mas só de não terem tentado empurrar que é possível humanidade sem cérebro já é lucro! Ainda que a grande maioria dos humanos só use o próprio cérebro para reproduzir memes alheios que, ao contrário dos rebentos resultantes de violação, sequer compartilham 50% de seu DNA. Daí porque a analogia parasítica as vezes funciona melhor.

O grau de manipulação é tão incrível, e tão antigo que, a própria parte vencedora no Caso Roe X Wade, que em 1973 legalizou o aborto nos EUA, demorou décadas para perceber que estava sendo usada, se arrepender e então se tornar militante pró-vida, e a maioria sequer sabe que as advogadas que a usaram eram financiadas pelo lobby das clínicas abortistas dos EUA que, amargando o prejuízo que o advento da Pílula Anticoncepcional lhes causou, precisava fazer algo para recuperar parte de seu lucrativo mercado.

Ao mesmo tempo, católicos ao invés de se concentrar em combater o aborto em si, condenam todos os métodos anticoncepcionais e preservativos sexuais sem os quais a civilização já teria entrado em colapso há muito tempo. E os fiéis o fazem sem ter a menor ideia de qual é a teologia por trás de tal condenação, que nem menciono aqui por que daria dois ou mais textos maiores.

Flutuando acima, ou abaixo, de tudo isso, há uma elite intelectual também manipulada pelas plutocracias abortistas que pagam suas bolsas de estudo, mas que ao mesmo tempo os manipulam de volta, puxando por contra própria as cordinhas dos titereiros que tentam controlar tais desobedientes marionetes.

Judith Thompson, a pioneira na linha de defesa acadêmica do aborto, 1971, merece um hipotético prêmio pela analogia mais esdrúxula do século XX (o feto como um violonista em hemodiálise), argumento cujo único mérito retórico é deixar o adversário perplexo e tentando entender como é possível alguém levar a sério tamanha panaquice. Michael Tooley, em 1972, bem mais honesto, embora insensível, que sua predecessora, insistiu em levar o argumento à sua consequência lógica e concluiu que se o feto não tem direito à vida por faltar-lhe auto consciência, então o mesmo deveria valer para os bebês ao menos até pouco mais de um ano. Idéia que, de tão horrível, o condenou à geladeira e só não caiu no ostracismo porque Alberto Giubilini e Francesca Minerva têm dito a mesma coisa recentemente, empurrados pela mesma argumentação inabalável, que decorre com perfeição uma vez aceita a premissa proclamada pela militância abortista. Por fim, o famoso Peter Singer (autor do “genial” conceito de ‘especismo’) faz-lhe coro, 1994, sem ver contradição entre sua defesa dos direitos dos animais por motivos fisiológicos completamente análogos aos fetos, e se recusar a expandir seu círculo de empatia justo aos únicos seres que algum dia serão capazes de tê-la plenamente.

E ainda assim, nenhum intelectual abortista jamais negou a humanidade do feto, por sabê-lo impossível para quem queira ao menos simular racionalidade, nem dedicou sequer um minuto às mulheres mortas no aborto clandestino. Deixe isso para a militância cuja função é gritar invés de pensar. Assim como deixe o contrário para a massa de crentes que acredita defender a humanidade intra uterina sem se dar conta de que suas tradições religiosas também a negam enquanto o espírito / alma não entrar no corpo (Eclesiastes 11:5), que se dá, advinhe? Por volta dos 3 ou 4 meses! Se não somente após o primeiro hálito pós parto!

Diante deste festival de incompetência, rebanho contra rebanho, mentes humanas reduzidas a fotocopiadoras de memes, inocentes e culpados úteis e inúteis, temos de tudo, menos reações plenamente humanas diante de manifestações mínimas de independência intelectual. Quando alguém traz a baila um dado solenemente ignorado pela quase totalidade, o que se vê nos comentários (o melhor burrômetro já inventado), são gracinhas doutrinadas pelo lobby abortista incapazes de articular uma reação racional diante de algo que foge por completo do bê-a-bá da cartilha rockefelleriana, e se limitam a repetir os mantras que os estupradores meméticos inseminaram-lhes cérebro adentro! Ao passo que os bravos defensores da vida, já advertidos desse fato, pensam que seu simples apontamento é suficiente para liquidar o assunto, ou repetem a ladainha do padre!

Outra mais recente são as panaquinhas que esfregam na Face o meme “Desde a liberação, em 2012, Uruguai não registra nenhuma morte por aborto clandestino!”, desavisadas de que o Uruguai JÁ NÃO REGISTRAVA TAIS MORTES DESDE 2001! Mas dá pra perdoar, considerando que um dos maiores abortistas do país, Dr. Leonel Briozzo, na maior caradura subentende mortes recentes, que não existem nas estatísticas que ele mesmo compilou sobre o assunto, limitado-se a mostrar somente as do período 1995-2001, apesar da publicação ser de 2008! (Revirei a internet uruguaia do avesso e não achei um único caso no século XXI.)

Enquanto isso a população Uruguaia, tal como no resto do continente 80% contrária ao golpe legislativo que descriminalizou a prática, tenta reverter a decisão por meio de plebiscito, sem se dar conta que o lobby abortista norte-americano, que colocou Leonel Briozzo no Ministerio de Salud Pública, já tomou todas as providências cabíveis e incabíveis nos 3 poderes do país para barrar a reação. Tal como está fazendo, aos poucos, no Brasil, só não tendo dominado ainda o Legislativo.

Enfim, aquele que em meio a tanta insanidade procura um sinal de vida inteligente, provavelmente só vai achá-la em Don Marquis, que em sua obra Why Abortion is Immoral, apresenta seu argumento fatal, que neutraliza num só golpe toda a patifaria e burrice envolvida no tema, reduzindo-o ao cerne principal e inescapável. Foi ele que, após mil textos de pontos de vista divergentes, ajudou-me a consolidar minha posição atual, embora meu argumento termine por ir numa direção diferente.

Marquis de certo desagrada alguns religiosos, ao dispensar por completo qualquer noção espiritualista em sua defesa da vida do feto, mas afugenta totalmente os abortistas, que não tem como sequer esboçar uma reação quando as pilhas de imposturas e trapaças argumentativas são subitamente removidas.

Chega a ser engraçado ver as poucas e débeis reações na tentativa de refutá-lo, que na maioria não passam de desleituras ou, em contraste com sua simplicidade imbatível, se perdem no meio de complexidades labirínticas incompreensíveis, a não ser talvez para quem tenha desperdiçado uma década de sua existência acreditando em Filosofia Analítica.

Com tamanha virtude, o resultado do argumento de Marquis não poderia ser outro que não o completo obscurecimento midiático e silêncio acadêmico absoluto, tentando inexistí-lo em nosso idioma.

Em Portugal, somente Pedro Galvão chama atenção para ele, no Brasil, só eu, e é difícil saber quem é menos ouvido.

Marcus Valerio XR

13 de Agosto de 2013


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